De 93 passamos direto a 98 pra falar do 90 Graus. Por que isso? Porque o CD está sendo relançado essa semana pela Open Field, gravadora de São Paulo responsável também por lançamentos de Bonde do Rolê, DJ Guab, Sebastião Estiva, Colorir, Lulina, Pan&Tone, Tony Da Gatorra.... então vê se você entende o que estamos fazendo aí... eu não faço a menor idéia.
O show de lançamento é nessa quinta no Milo (SP). Depois na sexta tem show no Praga (SP) e sábado no Bar do Zé em Campinas. Se liga na agenda do Myspace.
Mas, enfim, o fato é que uma galera - falando sério - vem pedindo que relancemos esse disco porque a primeira tiragem de 1999, lançada em parceria com a Monstro Discos (90 Graus foi o número 009 da Monstro!!!), acabou. Então agora tem de novo.
Ah: ornando esse post estão fotos da gravação do 90 Graus.
dessa bagunça só podia sair outra bagunça
Todos os discos dos Walverdes são de transição, mas o 90 Graus tem um significado muito especial em vários aspectos.
Primeiro porque ele foi mais peneirado que o álbum de estréia: um tiquitito mais experientes, resolvemos gravar logo de cara um set menor de músicas do que registrar tudo o que estávamos fazendo. Se isso deixou o 90 Graus com cara de EP, também fez dele um conjunto mais conciso e eficiente.
Outro ponto importante, e também diferente do primeiro disco, em 90 Graus reencontramos uma sonoridade mais crua e mais a ver com a essência do nosso som que está presente nas fitas cassetes lançadas anteriormente. Na verdade, 3 músicas de 90 Graus vieram da nossa última incursão no mundo do magnetismo: “Vem”, “Spaghetti” e “1996” faziam parte do tracklist da fita “Walverdes ao Vivo no Japão”.
coisa rara pra nós na época: afinação
O 90 Graus foi todo composto e gravado numa época meio dispersa da banda. Entre 97 e 99 estávamos cada um para um lado. Era uma época estranha, de bem poucos shows em Porto Alegre. A cena vivia uma entressafra. Estamos falando de 98 e uma outra cena bastante influente começava a despontar na cidade, em parte capitaneada pelo COL – CARDOSO ON LINE, um fanzine totalmente por email com textos de estudantes de comunicação cheios de gás e referências maluquetes. O COL foi uma das partes mais visíveis dos “novos tempos”, com seus bailões pioneiros movidos a mp3 em computadores toscos que eram montados em cima do palco do Garagem Hermética. Por outro lado, havia as Full Moon Parties, também no Garagem, misturando pela primeira vez o povo do rock e da eletrônica num ensaio do que viria a acontecer com mais propriedade quase dez anos depois. Em uma outra esfera, a música eletrônica tomava o espaço das bandas de rock, não por antagonismo, mas porque a cultura das raves (à base, primordialmente, de techno) começava lentamente a chegar na cidade com os tradicionais cinco anos de atraso. Ainda que patrocinadas e não muito clandestinas, as raves da época eram pulsantes, misturavam povos de várias nações, credos e estilos, o que hoje se perdeu totalmente na cidade. Outras festas bastante freqüentadas e mais interessantes que os shows de rock da época eram as Quartas Quebradas, totalmente dedicadas ao drum’n’bass.
O fato é que a cena do rock independente andava meio capenga e nós também. Sem muitos shows rolando, acabamos nos envolvendo em projetos paralelos. O Bruno, o Gian e o Marcos foram convidados pelo Wander para acompanhá-lo em uma turnê e na gravação do Buenos Dias. Antes, os três junto com o vocalista Renato Simpson, formavam a Chulé de Coturno, um excelente combo punk que havia entrado em estado de suspensão quando Renato se mandou pro Rio por conta do seu trabalho de jornalista.
Eu, de minha parte, havia voltado a tocar bateria esporadicamente com a Wafers - que contava com a Veri (hoje Hotel Camboja) no baixo e o Mauricio na guitarra, que logo viria a criar uma das personas mais famosas de Porto Alegre depois do Júpiter Maçã: Zé do Belo. Acho que fizemos apenas um show e gravamos duas músicas antes de eu cair fora da banda.
Nessa mesma época, o Pedro Veríssimo me contou que estava trabalhando em um novo projeto de um produtor meio americano meio brasileiro que recém estava de volta à cidade. Charles di Pinto, o Cholly, queria aproveitar seus equipamentos gringos usando os artistas locais e começou a agitar pelo menos dois projetos que deram bons frutos: um foi a coletânea Projeto Hyper, envolvendo gente de várias bandas. Outro foi a Tom Bloch. No estúdio de Cholly, a partir de uma música e da vontade do Pedro Veríssimo, começou a se formar a Tom Bloch. A germinação dessas duas sementes já daria um blog à parte.
marcos injetando uma brasilidade no disco
Para a produção do 90 Graus, chamamos o Iuri Freiberger, parceiro da banda desde o primeiro ensaio e responsável pela gravação de algumas de nossas cassetes. Hoje produtor chamado em tudo quanto é canto do país, na época o Iuri estava, como nós, descobrindo o que fazer dentro do estúdio. Como era tradição, entregamos nossas músicas ao Iuri com um orçamento apertadíssimo de gravação.
90 Graus foi gravado em fita magnética de ¼ de polegada e oito canais no Estúdio Underground, um lugar simples, despojado, tosco. Primeiro, gravamos a bateria, que foi reduzida para dois canais. A seguir, usamos os seis restantes pro baixo, as duas ou três guitarras e as vozes. As guitarras foram gravadas juntas, ao vivo. Tudo era monitorado numas caixas Sony de um system caseiro do Iuri, o que explica em parte porque o som do disco saiu meio toscão também. Isso foi em setembro de 98.
Só em outubro de 99 é que gravamos a voz e mixamos tudo no Cholly Studio, sem o Iuri, tudo com o Charles. Não me lembro bem porque não tivemos o Iuri junto. Nem ele lembra.
marcos & marco, o dono do estúdio
O processo de composição do 90 Graus foi o mesmo de toda a história dos Walverdes: alguém trazia um riff e trabalhávamos juntos em cima dele muito rapidamente até dar forma às músicas. Eu fiz grande parte das letras, mas deve ter alguma coisa que comentamos juntos em mesa de bar.
Musicalmente, cada música trazia mais evidente algum ponto das nossas influências: o Nirvana e os Pixies davam as caras em Câncer, Meu Bar e Música Away; o hardcore era o fio da meada de 1996; Spaghetti denunciava o quanto andávamos escutando Supersuckers; Eu Vou Sobreviver tinha um quê de Sonic Youth e um pouco da pré-historia do grunge (meio Melvins, meio Bleach). Ainda sobrava Vem, com um leve sabor psychobilly, que o Gian curtia bastante.
Uma pena que um tempinho depois do 90 Graus perdemos o Gian, que dividia as guitarras comigo desde o primeiro disco e que trazia uma bagagem que ajudou a formar a nossa identidade. Além de compor, diferente de mim o Gian também era capaz de solar e os solinhos que permeiam todo o disco são uma espécie de marca registrada do jeito como combinamos nossas guitarras.
nunca pensei que fôssemos ser bem falados na Guitar Player
Por pura implicância, resolvemos marcar o show de lançamento do 90 Graus fora de Porto Alegre. O local escolhido para marcar o início da função era o Curupira Rock Clube, uma fazendola em Guaramirim, interior de Santa Catarina, que atraía todos os malucos num raio de 200Km: indies, punks, hippies, bêbados, qualquer coisa que não estivesse alinhada com a cultura germânica-empreendedora da região convergia automaticamente para aquele galpão de madeira com chão e palco de cimento (no qual nós até pernoitamos uma vez).
Nos tocamos cinco pessoas no meu Ka: a banda e mais Vinicius, amigo do Marcos e escalado para ser roadie, porteiro, segurança, motorista e parceria.
mais estrelinhas que o Capital Inicial e a Kellis: isso é o que interessa
Por que 90 Graus? Na cassete “Vai, Criança, Faz a Tua Arte”, há uma música chamada 90 Graus. O nome da música não tem a ver com a letra, mas com a guinada de 90 graus que a música dá depois do segundo refrão.
Que, na verdade nem um refrão é, porque não tem nada cantado, é apenas a segunda repetição do primeiro break. Então é isso que é 90 Graus: uma guinada brusca e reta em uma direção perfeitamente perpendicular ao riff principal, executada após o segundo break em cujo lugar deveria, pela cartilha pop e bons modos, haver um refrão.
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